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Prisão civil injustificada para devedor de pensão alimentícia

João Trindade – Advogado

 

Ao contrário do que muitos pensam, a prisão civil do devedor de pensão alimentícia não é uma pena, mas sim uma forma, contundente, de obrigar o responsável pelo inadimplemento voluntário (leia-se bem: voluntário!) a quitar a obrigação, conforme o artigo 528, §3º, do CPC, que dá efetividade ao artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição federal.

É injustificável, portanto, a decretação dela, se for ineficaz para obrigar o devedor ao pagamento da dívida.

Seguindo esse raciocínio, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu, por maioria de votos, provimento a um recurso em Habeas Corpus (RHC 176091/RJ para um homem que deve R$ 42,8 mil de pensão alimentícia.

A filha, representada pela mãe, requereu a prisão civil do pai, para obrigá-lo a quitar a dívida. No HC, o devedor se defendeu, dizendo que passou por períodos de desemprego, nos quais fazia pagamentos parciais, de acordo com as possibilidades financeiras dele.

Em janeiro do ano passado, o ele conseguiu emprego com carteira assinada e uma decisão liminar para reduzir o valor da pensão. Ele passou a receber R$ 1,8 mil por mês e a pagar R$ 496,85, descontados direto da folha de pagamento.

O magistrado considerou que a obrigação vem sendo regularmente cumprida e a manutenção da prisão civil, “além de não se mostrar legítima, também não parece ser o melhor caminho; inclusive para a própria alimentada, ante a possibilidade de nova interrupção do pagamento, comprometendo o equilíbrio finalmente alcançado entre as partes”.

No entendimento do relator, a inadimplência não foi voluntária, uma vez que ficou comprovada a incapacidade financeira do pai de arcar com a pensão da filha na totalidade. Ressalta que atualmente, a obrigação vem sendo regularmente cumprida. Também não foi identificado risco para a filha, nem urgência na percepção da dívida acumulada.

O ministro destacou, porém, que o valor ainda precisa ser pago. “Pode a cobrança prosseguir, por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor”.

Percebe-se, no caso em questão, que a prisão foi afastada porque o STJ entendeu que o a inadimplência não foi voluntária e inescusável. Ficou comprovada a incapacidade financeira do pai em arcar com a pensão da filha, na totalidade, havendo pagamento parcial, em todo o período, podendo a cobrança prosseguir, por meio mais adequado, restrito à disponibilidade patrimonial do devedor.

inadimplemento voluntário da obrigação alimentícia: crime de abandono material

 

Não pagar, sem justa causa, pensão alimentícia ou abandonar emprego com esse fim configura o crime de abandono material, previsto no artigo 244, do Código penal, nos seguintes termos:

 

Art. 244 – Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: – Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País. – Parágrafo único – Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.

Observou-se, portanto, que além da prisão civil, que pode ser decretada pelo prazo de 01 (um) a 03 (três) meses nas hipóteses de, intimado, o devedor, em 03 (três) dias, não pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade absoluta de efetuá-lo (CPC, art.528§ 3º, e § 7º; e art. 911 e Súmula nº 309, do STJ) há, também, a previsão de punição na esfera criminal.

O Código de Processo Civil, deu ainda mais efetividade à apuração e punição do crime de abandono material, pois autoriza, no curso do processo de execução de alimentos, ao credor requerer, em Juízo, que oficie ao Ministério Público, no caso de conduta procrastinatória por parte do executado, para a verificação de prática de abandono material, conforme autoriza o artigo532, do CPC: “Verificada a conduta procrastinatória do executado, o juiz deverá, se for o caso, dar ciência ao Ministério Público dos indícios da prática do crime de abandono material”, crime previsto no artigo244, do Código penal.

A legislação também prevê punição a outras pessoas que ajudem a frustrar a implementação do pagamento da pensão alimentícia. Nesse caso, temos o crime contra a administração da Justiça, previsto no artigo 22, da Lei nº5.478/68 (Lei de Alimentos), que diz constituir crime deixar o empregador ou funcionário público de prestar ao Juízo informações necessárias à instrução de processo ou execução de sentença ou acordo que fixe pensão alimentícia. Também comete esse crime quem ajuda o devedor a eximir-se do pagamento da pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; ou se recusa ou procrastina a execução de ordem de desconto em folha de pagamento, expedida pelo juiz competente. Pena: Detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, sem prejuízo da pena acessória de suspensão do emprego de 30 (trinta) a 90 (noventa) dias.

 

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